segunda-feira, 30 de setembro de 2013

One-shot: The Ballad of Mona Lisa



O garoto levantou-se da cadeira acompanhado de um longo suspiro. Sacudiu a poeira da calça e começou a andar em direção ao salão principal, onde aconteceria o enterro de seu pai.
Enquanto caminhava pelo longo corredor passou em frente ao quarto de Mona Lisa. A porta estava entre-aberta e a garota pintava as unhas da mão de preto. Em seu redor havia algumas garrafas de gim vazias.
Balançou a cabeça, tentando tirar a imagem da garota da cabeça, e voltou a andar em direção ao seu destino final.
O salão principal estava decorado no tom preto, de acordo com a situação. No palco havia uma faixa escrita "Que Deus perdoe os vossos pecados" e o caixão de seu pai, aberto, mostrando o corpo pálido do homem.
Faltava ali a presença de poucas pessoas . Resolveu sentar-se em uma das mesas e isolar-se um pouco. Não queria receber a caridade das pessoas naquele momento.
Já havia se passado dez minutos quando as duas últimas pessoas chegaram. Uma delas era Mona Lisa. Ela trajava um longo vestido preto de camurça que deixava seu ombro nu. Seu cabelo escuro e encaracolado estava preso em um coque alto e desregular. As bochechas vermelhas mostravam uma possível embriaguez e ela parecia incrivelmente calma. Uma aparência tão inocente... Tudo o que ele sentia era uma vontade incontrolável de abraçá-la, mas ele não podia. Tinha que se controlar, só havia uma chance. Sentia-se um pouco culpado, mas não havia nada de errado no fato dela pagar pelos pecados que cometeu.
O padre iniciou o velório falando sobre o reino de Deus. Após todo o falatório chamou Gabriel ao palco para um breve discurso.
O garoto repetiu o ato de levantar-se da cadeira acompanhado de um longo suspiro. Sacudiu a poeira da calça e subiu ao palco.
De cima pôde observar o rosto de todos os moradores da cidade. Tudo deveria ser como ele havia planejado.
Mais um longo suspiro.
"Meu pai foi assassinado. - foi direto ao ponto, e como esperado, ninguém pareceu se surpreender - Assassinado por nossa querida Mona Lisa."
A garota observava tudo com um semblante calmo. Ah, como ele pagaria para vê-la preocupada...
"Um crime muito bem elaborado, devo dizer. Merece os meus parabéns, querida. - ele continuou a falar - Afinal, não é fácil fazer com que todos da cidade colaborem em matar o seu fundador. Me diga, Mona Lisa, como você o fez? Convenceu nossas anfitriãs a darem aquela festa, convenceu o medico a fornecê-lhe veneno, convenceu a padeira a colocar o veneno no bolo, convenceu a cantora a oferecer o bolo ao meu pai. E não paremos por aqui, você continuou convencendo muita gente. Convenceu o legista a trocar a causa da morte, convenceu o detetive a não procurar mais sobre o caso e convenceu a mim de que seria melhor assim. E esqueça aquela parte em que eu perguntei como você o fez, porque está claro como água para mim. Você está garantida para mandar nesta cidade. - as lembranças daquela noite vieram em sua mente, Mona Lisa havia lhe contado que seu pai estava morto e tudo o que ele pensou foi em beijá-la. Ele começa a sentir algo, chama isso de desespero- Diga o que você quer dizer, diga-me que estou certo. Me dê um sinal, eu quero acreditar."
Gabriel a olhou, já não procurava mais um sinal de que seu palpite estivesse certo, queria apenas saber se aquele beijo realmente havia significado algo para ela.
E parada em pé no canto da sala, Mona Lisa apenas sorriu, como se tivesse planejado tudo aquilo. Se ela tivesse as palavras certas para dizer, diria à ele. Mas ela não tinha mais nada para vender à ele.
"Estou satisfeito em satisfazer você." Ele pronunciou baixo e então desceu do palco. Suas palavras nadando em seus ouvidos, novamente.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Cinco pilulas, cinco memorias.

Ela parou em frente ao espelho, ajeitando-se uma última vez. O vestido preto de renda lhe caia muito bem e contrastava com o cordão em seu pescoço.
Passou mais algumas camadas de rímel nos cílios e soltou o cabelo, que caiu sobre seu ombro em cachos de um tom azul desbotado.
Mais uma olhada em seu próprio reflexo e estava pronta. Caminhou em direção a cama e sentou-se na mesma, em frente as cinco pilulas de algum remédio tarja preta que havia custado a conseguir dias atrás.
Cinco pilulas, cinco memorias.
Respirou fundo e tomou a primeira. Era uma memoria antiga, de sua infância. Estava sentada na garagem de casa, observando a rua vazia. Não costumava ter amigos naquela época, então ela havia o inventado, com aquele sorriso encantador e os olhos pretos profundos. Ele a fazia companhia em seus momentos de solidão, estivera ali por muito tempo, até os seus oito anos.
Tomou a segunda pilula e lembrou-se de como se sentia antes de tê-lo encontrado de verdade, sem ser em seus devaneios de criança solitária. Ela havia estado perdida por muito tempo.
A terceira pilula lhe trouxe a memoria da primeira vez que o encontrou. Estava na escola, a principio não reconhecera aquele sorriso que tanto a acalmara a tempos atrás.
Suspirou, as lagrimas teimando em escorrer pelo seu rosto. Tomou a quarta pilula, não poderia mais voltar atrás agora. Lembrou-se dos momentos com ele. Do abraço dele a reconfortando nos piores momentos, da voz dele a fazendo rir, do formigamento que sentia nas pontas dos dedos toda vez que o beijava.
Então tomou a quinta pilula e era como se ele estivesse ali com ela, segurando sua mão, fazendo-a acreditar que tudo daria certo.
Deitou-se na cama, apegando-se aquela última lembrança. Havia chegado a hora, ela sabia. Então deu o seu último suspiro e fechou os olhos.

Um conto sobre a primavera

O sol desaparecia no horizonte, deixando o céu em uma mistura encantadora entre o azul escuro e o alaranjado. Fazia frio naquela quase-noite de primavera, os ventos úmidos da recente chuva ainda sopravam fortes, trazendo aquele cheiro de terra-molhada consigo.
Nico estava sentado no telhado de sua casa observando o céu, ele segurava uma rosa azul e perdia-se em seus pensamentos quando escutou a voz dela o chamando. Olhou para os lados, procurando por Talissa. Estava confuso. Como ela poderia estar ali?
- Uma ajudinha aqui, por favor. - ele escutou e novamente começou a procurar - Aqui em cima, seu baka.
Foi então que ele a viu, segurando-se firme em uma arvore para não escorregar, esforçando-se para chegar até onde o garoto estava. Antes que Nico pudesse se mover ela conseguira sentar ao lado dele, ofegante. Os cabelos caiam em seu rosto em um emaranhado azul e as maçãs de suas bochechas estavam vermelhas.
- De onde você veio? - Ele perguntou, encarando-a
- Do céu, oras.
Talissa colocou uma mecha de seu cabelo para trás, e sorriu, como se aquilo fosse a coisa mais normal de todas.
- Você não veio do céu. - ele respondeu, um meio sorriso aparecendo em seus lábios - Não tem como você ter vindo do céu.
- Eu sou um anjo, esqueceu?
- O meu anjo?
- O seu anjo.
Agora o céu já havia caído em um azul profundo. A lua minguava alta, com algumas poucas estrelas.
Nico estendeu a rosa azul para Talissa, que a pegou como se fosse o maior tesouro de toda a sua vida.
- Estou feliz por você ter voltado. - ele falou, segurando a mão da garota
- Eu também.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Anjos e o amor

O sangue escorreu por suas costas quando as asas brancas nasciam de dois pequenos cortes, há muito tempo já cicatrizados.
À medida que as primeiras penas iam saindo, em seu esplendor de plumagem branca, a dor aumentava. No começo era suportável, mas quanto maior as asas ficavam mais a dor a torturava. Podia sentir as lagrimas quentes em suas bochechas, a visão embaçada impedindo-a de decifrar as formas que a rodeava.
Ajoelhou-se no chão frio, levando as mãos as costas em uma tentativa desesperada e falha de evitar aquilo. Mas tudo o que a garota sentia era o calor de seu sangue contra sua pele. E as duas asas iam crescendo, em toda a sua inocência e dor.
E depois de alguns instantes, que pareciam mais um infinito, a dor cessou. E com o final da tortura veio o sentimento de calmaria.
A garota agarrou-se a ultima lembrança boa que ainda lhe restava e levantou-se, olhando para o céu azul. Caminhou em direção a imensidão, um pé de cada vez, sentindo a poça que seu próprio sangue havia se formado.
E quando sentiu que algo a esperava lá em cima, levantou voou. As lembranças do que a garota já fora um dia retornavam a tona, fazendo-a recorda-se de que o infinito era maior do que instantes e de que instantes apenas os humanos entendiam, em sua vida frágil e perversa.
Talvez ela fosse sentir falta dos sentimentos trazidos em seus dias de queda. Daquela última lembrança boa  a qual se agarrada em seu momento de dor: aquele garoto que tanto a cuidara.
Mas agora ela estava retornando ao seu único e verdadeiro lar. Voltava a entender o verdadeiro significado da paz e lamentava-se por não podê-lo ensinar para aquele garoto de sorriso fácil.
Deveria agora, acima de tudo, dedicar-se a sua nova missão. Se estava sendo chamada de volta era porque seus pecados haviam sido redimidos e uma nova chance havia sido dada. Era uma pena, que para isso, ela precisasse abrir mão de sua vida humana.
Mas veja só, que surpresa aquele antigo lugar lhe trazia. Sua missão era cuidar daquele que a ensinara a cultivar o mais puro sentimento humano: o amor.

sábado, 7 de setembro de 2013

Mais um da série: perdidos e achados :P

Eu gosto da voz dele e de como eu me sinto bem quando o escuto falar. Gosto do cabelo dele, da pele e do sorriso. Gosto do formato da boca dele. Gosto de quando ele me olha. Gosto das feições dele. Gosto de quando ele é tímido. Eu gosto do cheiro dele e de como eu o sinto toda vez que penso nele. Eu gosto de pensar nele. Gosto de quando ele anda com as mãos nos bolsos. Gosto de como ele me decifra com tanta facilidade. Eu gosto quando ele está ao meu lado. Gosto quando ele é sincero comigo. Eu gosto das mãos dele e de como me sinto bem quando as seguro. Gosto do abraço dele e da vontade que eu tenho de não soltá-lo nunca mais. Eu gosto quando ele tira o meu sono e também gosto quando sonho com ele. Gosto de como ele consegue tornar o meu maior medo em algo tão comum. Eu gosto quando olho para o céu e lembro dele. Gosto quando eu olho para qualquer lugar e lembro dele. Gosto de lembrar dele. Eu gosto quando ele cita trechos de minhas histórias e gosto quando ele me ajuda a escrevê-las. Gosto de escrever histórias para ele. Eu gosto de como ele me faz sorrir. Gosto do frio na barriga que eu sinto toda vez que ele se aproxima. Eu gosto de ser dele. E eu gosto dele e gosto de gostar dele.