segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

O milagre da coxinha de natal -qq

Dedicado pro Ícarus, meu irmãozinho :3 

Aquela era a oitava partida de dominó que jogávamos e eu já não aguentava mais meu irmão (na verdade, meio-irmão, mas eu odeio esse termo, parece que eu parti o garoto ao meio) ganhando. Eu não havia ganho nenhuma partida e eu não conseguia entender que tipo de macumba ele fazia para conseguir me vencer tantas vezes. Mas o que mais eu poderia fazer para passar o tempo a não ser perder no dominó para o Ícaro?
Era o final de tarde da véspera de Natal, não tinha nada de bom passando na televisão e para completar a internet não estava prestando por causa do mau tempo. Eu poderia estar atormentando minha mãe pra saber o que ela tinha comprado de presente pra mim, mas ela e o sr. Barboza haviam saído para comprar o resto das coisas para ceia (um pouco em cima da hora, não vamos negar) e deixado a casa na responsabilidade do Ícarus, já que ele é quatro meses mais velho que eu (grande coisa).
- Xeque-mate! - ouvi meu irmão dizer ao ganhar mais uma partida
- Isso não é xadrez. - o encarei
- Mas eu cansei de falar "bati".
Deitei no chão, encarando o teto. Estava quase sugerindo que fossemos fazer outra coisa quando a campainha tocou.
- Eu atendo! - gritei, enquanto me levantava em um salto
Abri a porta e me deparei com um garoto coberto de neve que eu conhecia muito bem.
- Você trouxe algo para a gente fazer?
Matheus me encarou no mesmo momento em que perguntei.
- É assim que você recebe as pessoas? - ele riu e nos abraçamos. - E sim, eu trouxe meu x-box.
Fiquei tão feliz por estar livre do dominó que nem me importei de passar as duas horas seguintes jogando video-game. Aliás, eu nunca me importaria de passar as horas seguintes do meu dia jogando, porque, sinceramente, é algo muito bom de se fazer.
Mas o tempo foi passando e nada da minha mãe chegar. Eu estava com fome, muita fome.
- Estou com fome. - falei, enquanto apertava os botões do controle mais forte do que o necessário.
- Quero coxinha. - Ícaro falou e me encarou
Fiquei imaginando a coxinha saindo do forno, quente, com o recheio de catupiry derretendo.
Dei pausa no jogo e suspirei, tentando afastar a imagem da comida de minha mente.
- Por que não vamos comprar, então?
- É! - Matheus disse e pela reação dele eu tive certeza que ele também estivera imaginando a coxinha.
Levantei-me e comecei a vasculhar o bolso do meu moletom, tirando de lá 15 pila e alguns quebrados. Fiz as contas mentalmente e não pude deixar de sorrir: aquilo daria para umas sete coxinhas.
- Devíamos esperar o papai chegar. - Ícarus falou - Ele disse pra gente ficar em casa e se comportar.
- Eles não estão em casa, cara. - Matheus também se levantou - A lanchonete fica daqui a cinco ruas, podemos ir e voltar antes deles chegarem em casa.
- Pense na coxinha, na massa macia e crocante, no frango desfiado se misturando ao catupiry, tudo isso derretendo na sua boca... - falei
- Certo, vamos antes que eles cheguem.
Sorri e abri a porta, saltitando até o jardim. A neve caia sobre a grama e ia se amontoando. Meus pés afundavam a cada passo que eu dava.
Olhei para trás e os meninos vinham conversando sobre alguma coisa. Resolvi ir na frente e continuei saltitando.
Quando cheguei em frente a lanchonete ela estava fechada. Não pude acreditar que eu havia andado até ali para nada.
- Minha coxinha! - choraminguei e abracei Matheus
- Nossa coxinha! - ele choramingou junto
Escutei um baque surdo e me virei a tempo de ver Ícarus se ajoelhando no chão.
- WHY, LORD, WHY? - ele apontava para o céu
Depois de fazermos um pouco de drama, resolvemos voltar para casa.
- Está ficando mais frio. - falei quando faltavam 3 ruas para chegarmos
- Está mesmo. - Matheus concordou
- Corrida até em casa? - sugeri e os dois concordaram.
Corremos e rimos pelas três ruas seguintes. Quando chegamos em frente de casa, Ícarus parou e respirou. Matheus fez o mesmo e eu corri em direção a porta, mas quando tentei abri-la ela continuou no mesmo lugar e eu acabei caindo de costas na neve.
- Onde está a chave? - acabou soando mais como uma afirmação
Ícaro se abaixou do meu lado.
- Você não trouxe? - fiz que não com a cabeça - Estamos presos... - ele deitou na neve
Matheus também deitou na neve e segurou minha mão.
Nós três ficamos ali pelo que pareceu uma eternidade. Estava ficando frio, estava escuro e eu ainda pensava no gosto da coxinha.
- Eu só queria a droga de uma coxinha. - choraminguei - E agora estou na neve morrendo de frio.
Escutei o barulho da porta se abrindo e vi minha mãe nos encarando.
- Vão ficar aí deitados para sempre? - ela falou - Entrem logo, eu trouxe a droga da coxinha.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Um conto de natal

Dedico para a minha Samantha, que me inspirou a escrever isso com as doidices dela <3

Era a tarde da véspera de natal e não havia nada para fazer.
Sentei no sofá perto da janela, abri um pouco da cortina e observei o céu.
- Samantha, venha cá. - falei para a minha amiga, que estava entretida na forma em que o rabo do Michel, meu cachorro, se movia.
- O que é? - ela me encarou - Não vê que estou ocupada?
- Eu faço o favor de deixar você passar o natal com a minha família e é assim que você me trata? - tentei fazer pose de brava, mas acabei rindo.
Sentei no chão, ao lado dela. Fiquei a encarando por algum tempo, tentando fazer com que ela prestasse atenção em mim.
- Tudo bem, Ane. O que você queria me mostrar?
- Não importa mais.- a provoquei
- Importa sim. - Samantha cutucou minha bochecha, o que eu odiava.
Dei um murro de leve em seu braço e nós rimos.
- Acho que vai nevar, sabia? Quer dizer, a moça da TV não para de falar sobre isso e olhe só para o céu!
Ela virou para trás, encarando o céu lá fora. Depois olhou pra mim e fingiu se abraçar e tremer.
- Sem falar que está frio!
Rimos novamente.
- Acho que devíamos fazer alguma coisa. - puxei Michel para perto de mim
- Devíamos ir atrás dos meninos. - Samantha se levantou, parando na minha frente
Fiquei pensando um pouco na ideia. Tudo bem que eu sentia falta do Matheus e provavelmente Samantha também sentia falta do Daniel, mas ir atrás dele seria loucura. Quero dizer, eles estão do outro lado da cidade e nem sabemos o endereço. Seria como procurar agulha no palheiro. E foi exatamente isso que falei para a Samantha e tudo o que ela fez foi continuar parada na minha frente.
- Nós sabemos qual é o bairro e eu tenho uma foto da casa! Não pode ser tão difícil assim!
- E como chegaríamos lá? - indaguei
- De metrô, é claro.
- Acho melhor não... - comecei a falar, mas fui interrompida
- É véspera de Natal, Tauane! - ela começou a gesticular com as mãos - Há pessoas acreditando em milagres de natal neste exato momento. Há pessoas dizendo que amam umas as outras, pessoas se preparando para passar esta noite magica com quem amam! E enquanto isso nós estamos fazendo nada. Sabe o que podíamos estar fazendo? Podíamos estar a caminho de abraçar as pessoas que amamos!
Perguntei-me mentalmente como havíamos chegado neste ponto. E ao mesmo tempo em que me perguntava isso eu sabia que minha amiga estava certa.
- Isso é loucura, você sabe né? - falei, enquanto me levantava. Samantha ficou tão feliz que pensei que seu sorriso iria sair de seu rosto.
Fomos para o quarto e vestimos nossas roupas mais quentes. Coloquei meu moletom do Stitch, calça jeans e meu par de all star preferido. Samantha estava com uma roupa parecida, mas o moletom dela era do Mario.
- Não vai colocar seu gorro? - ela perguntou e eu me virei para minha cama, que estava uma mistura de roupas, cobertas, ursinhos de pelúcia e travesseiros
- Ele está em algum lugar por aqui.
Comecei a procurar pelo gorro, mas não conseguia achá-lo. Criei uma nota mental de que deveria ser mais organizada.
- Não consigo achá-lo. - falei, desistente
- Certo. - Samantha encarou minha cama - Vá pegar dinheiro que eu procuro.
Abri meu cofrinho e peguei todo dinheiro que tinha. No total havia dado 25 reais. Acho que aquilo seria o suficiente. Quando me virei para Samantha ela segurava meu gorro de panda.
- Onde está meu gorro azul? - perguntei
- Só achei esse. - ela colocou o gorro na minha cabeça - Que fica muito fofo em você. Está tudo pronto?
Chequei meus bolsos.
- Celular, chaves de casa e dinheiro. Tudo pronto, senhorita.
Fomos andando em direção a porta, até que minha mãe nos parou. Ela tinha um sorriso no rosto que provavelmente significa "rá, peguei vocês!" e aquilo não era nada bom.
- Onde vocês pensam que vão, mocinhas?
Eu pude jurar que naquele momento ela nos obrigaria a voltar pro quarto, onde sentaríamos e comeríamos chocolate até de noite. Mas aí Samantha começou com seu discurso natalino e minha mãe acabou cedendo.
- Quero vocês em casa antes das oito, certo?
- Certo. - falamos juntas.

Alguns minutos depois estávamos na estação esperando o metrô.
- Cadê essa coisa que não passa. - falei, olhando pro relógio que havia na estação - Já são cinco horas, vamos demorar pelo menos uma hora e meia para chegar lá, desse jeito não chegaremos em casa a tempo.
Samantha me encarou.
- Deixa de ser chata, Tauane. - ela andou pra frente e espiou pelos trilhos a frente - Olha só, o metrô já está vindo!
Ouvi o barulho das rodas deslizando nos trilhos e em seguida o metrô estava na nossa frente. Entramos e sentamos perto da janela.
- Agora pare de se preocupar, já estamos a caminho, certo?
Balancei a cabeça positivamente e fiquei encarando a janela. Depois de algum tempo em silencio começamos a conversar sobre Harry Potter.
Nos distraímos tanto que só paramos de conversar quando percebemos que havia começado a nevar.
- Está nevando! - Samantha falou, sorrindo
Concordei, olhando para os flocos de neve que caiam.
- Está nevando faz um bom tempo. - a mulher que estava sentada na nossa frente falou e depois voltou a prestar atenção em seu jornal.
- Neve, neve, neve, sua linda. - falei, agora sorrindo também.
Mas toda a minha felicidade de ver neve se fora quando o metrô deu um solavanco e parou. Cai de joelhos no chão e Samantha bateu com a cabeça na janela.
- Ai - ela exclamou
Outras pessoas também haviam caído no chão. Em segundos o vagão havia se tornado um caos, com pessoas perguntando o que havia ocorrido, crianças chorando no colo das mães e adolescentes estéricos falando sobre apocalipse zumbi.
- Qual o problema dessas pessoas? - perguntei-me enquanto levantava e sentava de volta em meu lugar
- O que você acha que aconteceu? - Samantha me encarou
- Problemas técnicos, talvez?
Ficamos levantando suposições do que havia ocorrido até que um guarda entrou no vagão e explicou que os trilhos haviam emperrado por causa da neve e que provavelmente demoraria algumas horas para resolver o problema.
- Quem achar mais preferível descer do metrô está livre para fazê-lo. Peço apenas a paciência de todos para que possamos resolver o problema sem tumultos.
Olhei para Samantha e ela me olhou.
- Vamos descer, estamos há duas estações do terminal de ônibus. Podemos andar até lá e depois pegar um ônibus que vá para o bairro dos meninos - falei
- Duas estações daria quanto tempo de caminhada?
- Hum... - tentei calcular tudo mentalmente - Não passa de 15 minutos.
- Era só o que me faltava, ter que andar - Sah se levantou, resmungando
- Não reclama não, eu falei que isso era uma loucura, mas ninguém escuta a Tauane.
Descemos do metrô e Samantha me encarou. Lá fora estava mais frio e mais escuro do que pensávamos. A neve caia fina sobre a grama mal aparada. Caminhamos em silencio para fora dos trilhos até a calçada mais perto.
- Para onde, agora? - Samantha me perguntou, esfregando as mãos uma na outra
- Para o norte. Já consigo ver o terminal daqui.
- Pelo menos isso.
Fomos andando e na medida que a neve continuava a cair mais forte, mais devagar nós andávamos.
- Não vamos chegar nunca. - resmunguei, olhando para frente.
Eu podia ver o terminal, mas estava cansada e com frio. Queria me esquentar e tomar chocolate quente enquanto esperava a hora de celebrar o natal com a família e me preparava mentalmente para o tio chato do pavê ou pacumê.
- Estamos chegando, estamos chegando.
Samantha se aproximou de mim, entrelaçando os braços comigo.
- Para nos mantermos aquecidas. Agora pense em como a casa do Matheus deve ser aconchegante só por ser dele. Pensou? - ela me olhou e eu fiz que sim com a cabeça - Agora use isso como motivação, porque nesse exato momento eu só consigo pensar em como o beijo do Daniel é bom.
Começamos a rir e acabamos tropeçando em um galho, caindo na neve. Estar na neve era divertido. Comecei a fazer anjos de neve enquanto encarava o céu. Eu podia sentir os flocos caindo em meu rosto e aquilo me fazia sorrir. Também me fazia ter mais vontade de chegar na casa dos meninos. Samantha parecia estar sentindo a mesma sensação que eu.
- Me sinto mais esperançosa. - ela falou, levantando-se em um salto - Corrida até o terminal?
- Claro.
Também me levantei e então nós corremos.

Chegamos ao terminal e nos abraçamos, ofegando.
- Nós conseguimos! - Samantha falou, dando pulinhos
- Ainda não, querida. - eu apontei pro ônibus - Vem, temos que entrar naquele ônibus.
Paguei as passagens do ônibus e pedi que o cobrador nos avisasse quando fosse a parada certa. Quando me sentei no banco peguei meu celular. Já eram sete horas. Minha mãe provavelmente nos mataria.
Pensando nisso acabei mandando uma mensagem para o Matheus. "Estou indo para a sua casa junto da Samantha. Não sei onde fica, mas estou indo do mesmo jeito."
Quando terminei de enviar Samantha me encarava.
- O que foi?
- Não é melhor você falar pra ele nos esperar?
Acabei caindo na gargalhada. Quando parei de rir notei que ela realmente falava sério.
- Tudo bem. - peguei o celular e escrevi outra mensagem. "Espere por mim." - Satisfeita agora?
- Sim. - ela sorriu e começou a olhar pela janela. Minha amiga é doidinha das ideias, como diria minha mãe.
Nos minutos que se passaram eu fiquei viajando em meio aos flocos que caiam na janela do ônibus. Fiz isso até que o cobrador nos avisou que nossa parada havia chegado.
Descemos do ônibus e encaramos as dezenas de ruas que haviam ali. Nunca acharíamos a casa dos meninos, ainda mais agora que tudo estava coberto de branco.
- Está pronta? - perguntei para Samantha e ela concordou com a cabeça.
Entramos na primeira rua e fomos andando. Nenhum sinal da casa deles. O mesmo se repetiu pelas próxima 10 ruas.
- Chega, eu desisto. - falei, sentando em uma calçada qualquer
- Desiste porque? - Samantha me entregou o celular dela e na tela havia uma foto do Daniel e do Matheus com uma casa atrás - Não reconhece a casa?
Virei-me para trás e percebi que aquela era a casa da foto. Não pude deixar de sorrir. Aquilo havia sido uma loucura, mas havíamos conseguido.
Antes que eu pudesse me mover a porta se abriu e eu vi Matheus. Ele andou até mim e me abraçou forte.
- Oi. - falei
- Quando eu vi sua mensagem pensei que você ia se perder por aí e eu nunca mais ia ver você. - ele me encarou sério
- Desculpa? - falei, com um meio sorriso nos lábios
- Hum... - ele continuou com o semblante sério, então sorriu e me beijou. Os labios dele me fazendo ter certeza de que eu não poderia ter feito uma loucura melhor.
- Então, vocês vão ficar aí fora ou vão entrar e comer pudim? - Ouvi a voz de Daniel. Ele já estava na porta, abraçado com Samantha.
Adentramos a casa e eu encarei o relógio. Faltavam 10 minutos para as oito da noite. Minha mãe teria que me desculpar, mas de certo modo eu estava em casa.